Vejam bem o currículo dos magistrados brasileiros. Homens e mulheres que demonstraram capacidade para roubar bens públicos e hoje são magistrados. Tem um errinho na matéria: comparar a confraria do sino (na verdade quadrilha do sino) a uma organização maçônica é um erro grosseiro, pois até onde eu sei, a maçonaria prima pela pureza do caráter e das ações de seus membros e investiga criteriosamente seus candidatos a ingresso em seus quadros.
GRACILIANO ROCHA
da Agência Folha, em Porto AlegreAo longo dos últimos 40 anos, ministros, juízes e advogados militam em uma confraria dedicada a esconder um sino furtado da faculdade de direito da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).
Entre os membros da chamada Ordem do Sino estão o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e atual ministro da Defesa, Nelson Jobim, o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ari Pargendler, e o corregedor do Conselho Nacional de Justiça, Gilson Dipp.
O sino de bronze, cujas badaladas marcavam o início e o fim das aulas na faculdade, foi surrupiado pelos formandos da turma de 1968 e desde então circula entre os ex-alunos, que se recusam a devolvê-lo ao patrimônio da universidade.
Em 1978, dez anos após a formatura da turma, a Ordem do Sino ganhou até um estatuto –que considera o produto do furto “símbolo da turma” e estabelece uma liturgia de alternância anual na guarda do sino.
Todos os anos, durante um jantar comemorativo em novembro, a peça troca de mãos. Segundo a advogada Maria de la Luz Kramer, que faz parte da ordem, o critério para ter o privilégio de esconder o sino da faculdade é o maior número de participações nos jantares anuais dos ex-alunos de 68.
Nelson Jobim furou a fila em 1997. Menos assíduo do que outros egressos, recebeu a “honraria” logo após se tornar ministro da mais alta corte do país. Amigos de Jobim contaram à Folha que ele guardava o sino no seu gabinete no STF.
Pargendler já foi “agraciado” em 1988. Dipp, com retrospecto de oito jantares de ex-alunos, ainda aguarda sua vez.
“Não devolveremos o sino até que haja apenas um sobrevivente da nossa turma”, diz o advogado Paulo Wainberg, 64, que guardou o sino até o final de novembro. Dos 93 formandos de 1968, 16 já morreram.
Os integrantes da Ordem do Sino minimizam a subtração do bem público. Wainberg prefere usar o vocábulo “empréstimo” a furto para designar a posse do objeto.
“Esse sino tem a história de uma das turmas mais brilhantes da faculdade. O roubo em si ficou em segundo plano. É uma história de união, somos a única turma que se reúne todo ano”, defende Kramer.
Durante muito tempo, a “maçonaria” do sino guardou segredo sobre os nomes do autor do furto. A façanha é atribuída ao ex-chefe da Casa Civil do governo Alceu Collares (1991-1994), Conrado Alvares, morto em 1992.
Ontem à tarde, a Folha confirmou que o sino furtado está em Porto Alegre, na casa do juiz aposentado Elvo Pizzato.
A peça de bronze, com cerca de 30 centímetros de altura e 10 quilos, traz gravadas os nomes dos que já a esconderam.
Pargendler se recusou a comentar o caso. A reportagem não localizou Jobim nem Dipp.
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