A presidência de Dilma Rousseff completa um mês nesta segunda (31). A experiência de poder da sucessora de Lula, embora curta, revelou-se instrutiva.
Beneficiada pelo silêncio da oposição, Dilma assistiu à conversão de aliados no pior tipo de adversário: o inimigo cordial.
O noticiário negativo que assediou Dilma em seus primeiros trinta dias de governo teve produção 100% doméstica.
Sócios majoritários do consórcio governista, PT e PMDB trocaram cotoveladas ao redor das poltronas mais vistosa$ do segundo escalão.
Apoiadoras de Dilma na campanha eleitoral, as centrais sindicais levaram o debate do salário mínimo às ruas.
Domesticado nos dois reinados de Lula, o baronato sindical mordeu Dilma antes mesmo da tentativa de assopro de Gilberto Carvalho, o ministro que negocia em nome dela.
Mal desceu das nuvens da posse para o chão liso da rotina administrativa e Dilma já se deu conta de que, no poder, só há um amigo possível. O amigo do alheio.
Afora a descoberta de que terá de lidar com pseudoaliados, Dilma fabricou, ela própria, uma inimiga insuspeitada: a barriga.
Até aqui, sempre que submetida à necessidade de decidir, Dilma pensou dez vezes, analisou todas as possibilidades, consultou auxiliares… E não decidiu.
Os caças da FAB? Barriga. O nome para a cadeira vaga no STF? Barriga. As nomeações dos escalões inferiores? Barriga de novo.
Até os cortes no Orçamento da União, que Dilma considera urgentes e prioritários, foram golpeados pela política da pança.
Dilma programara a descida da lâmina para a primeira quinzena de janeiro. Queria que o talho viesse à luz antes da reunião do BC sobre juros.
A diretoria do BC, porém, foi à mesa do Copom sem conhecer o tamanho da faca. Devolveu a taxa Selic ao elevador.
Os cortes? Bem, a barriga promete-os para fevereiro. Por ora, Dilma não apôs sua assinatura nem no projeto de Orçamento que o Congresso aprovou em dezembro.
Em meio à bruma de indefinições, a ministra Mirian Belchior (Planejamento) declarou que a lâmina pode alcançar inclusive as verbas do PAC.
E Dilma: “Nós não vamos, nós não vamos –vou repetir pela terceira vez— nós não vamos contingenciar o PAC”.
Além de desencontros, a tática presidencial de estacionar diante das bifurcações que lhe chegam ao gabinete espalha insatisfações ao redor.
Em privado, a cúpula da Aeronáutica derrama-se em queixumes por conta do novo adiamento da aquisição dos caças.
As togas do Supremo impacientam-se com a demora do Planato (já lá se vão oito meses) em indicar um substituto para o ministro aposentado Eros Grau.
De resto, ao protelar a distribuição das cadeiras do segundo escalão, Dilma rogou a petês e pemedebês que parassem de prover matéria-prima às manchetes.
Silenciaram as vozes. Porém, começaram a falar os dossiês. Órgãos como a Funasa e estatais como Furnas passeiam na praça com as víscera$ à mostra.
Dilma leva sobre Lula uma desvantagem. Não pode usufruir da desculpa da herança maldita. Condenou-se a continuar o legado. Inclusive nas parcerias indigestas.
O primeiro mês de Dilma serviu, assim, para eliminar uma ilusão que acomete todo presidente novo. A ilusão de que preside.
Por enquanto, Dilma foi presidida pela própria hesitação e pelos interesses contraditórios que a rodeiam.
Com a volta do Congresso, vai-se descobrir o que a oposição pretende fazer com ela. Antes, PSDB e DEM terão de decidir o que fazer consigo mesmos.
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