Lago amazônico e Belo Monte

A Amazônia desde sempre foi ambicionada e estudada pelo “bigbrother”. Líderes de várias nacionalidades se manifestam ainda hoje sobre a internacionalização do “grande pulmão do mundo”.

O Lago Amazônico foi uma tentativa frustrada. Em 1968, assisti a uma palestra em um clube da Tijuca, Rio de Janeiro, sobre o represamento a ser feito, concebido pelo Instituto Hudson dos EUA.

Com entusiasmo o palestrante apresentou um resumo do estudo executado, com projeção de slides, a demonstrar como obter-se o imenso lago, por conta dos rios da bacia existente e “conveniente” barragem. Os milhares de quilômetros quadrados do lago iriam proporcionar muito “progresso” para a região, como o incremento ao turismo, à piscicultura, à navegação interior, bem como permitir em melhores condições integrá-la à do Prata.

A refletir sobre tantos benefícios submersos, com mais dificuldade de pesquisa e exploração das riquezas do solo e do subsolo, mascarando fauna, flora e minerais. Os governos de então repeliram tal estudo e proposta.

A História confirma as incursões sobre a floresta em busca de riqueza, ambição do homem por possuir mais em seu nome, atender às necessidades do seu povo e, para aproveitar a biodiversidade, patentear descobertas e pouco ou nada a melhorar as condições de vida dos locais.

A conquista, a defesa e a consolidação da Amazônia brasileira não foram feitas sem luta e sem dor por muitos que lá viveram, a empunhar armas, derramar o próprio sangue oferecendo a vida ao enfrentar o inimigo invasor e a suportar as doenças da floresta tropical.

Pois bem, o imenso lago – muito maior que o represamento necessário à Usina de Belo Monte -, e que só traria “prosperidade”, não teve a oposição que se faz à obtenção desse recurso, este sim, importante na produção de energia, base para outras atividades produtivas, geração de empregos, indústria e principalmente o preenchimento dos vazios demográficos, com reflexo na soberania da cobiçada área, que interesses internacionais pretendem manter como “reserva”.

Será que nosso povo mestiço, índio, branco, negro, ribeirinho, deve ser condenado a tomar banho e lavar a roupa no rio? Não dispor de água no tanque, no chuveiro, no sanitário? Condenado a acender vela nas noites para estudar ou dormir ao escurecer? Não dispor de televisão, computador para se desenvolver e ter um mínimo de lazer?

Artistas fizeram campanha contra Belo Monte. São ribeirinhos? Moram em palafitas? Onde os seus filhos estudam?

A Constituição cidadã de 1988, a criação de imensas reservas indígenas, tipo Raposa Serra do Sol e Ianomami, em Roraima, onde o governador administra 60% do Estado e decisões da Justiça criam vulnerabilidades para a integridade territorial.

Recentemente foi interrompida a obra de construção da hidrelétrica de Belo Monte, até que os índios sejam ouvidos sobre a questão. Já tinha sido suspensa a obra da usina hidrelétrica de Teles Pires, na divisa entre Mato Grosso e Pará. O grande lago seria “bom” para o Brasil, já Belo Monte vai “prejudicar o meio ambiente, inundar áreas, acabar com os peixes”. No interesse de quem, hoje?

O passado ilustra. Muito aquém das Constituições brasileiras, a Carta da rainha Maria I, de 12/05/1798, ao governador do Estado do Pará, discorre sobre alguns aspectos interessantes, da absorção do silvícola à comunhão nacional e à incorporação ao Exército:

“D. Francisco de Souza Coutinho…

Sendo a civilização dos índios, habitantes dos vastos distritos dessa Capitania, um objeto mui digno da Minha Maternal atenção, pelo bem real que eles, não menos do que o Estado, acharam em entrarem na sociedade, e fazerem parte dela, para participarem igualmente com os outros meus vassalos dos efeitos do meu contente e [ilegível] interrompido desvelo em os amparar à sombra das saudáveis determinações. Hei por bem abolir e extinguir de todo o Diretório dos Índios estabelecido provisionalmente para o governo econômico das minhas Povoações, para que os mesmos índios fiquem, sem diferença dos outros meus vassalos, sendo dirigidos e governados pelas mesmas leis, que regem todos aqueles dos diferentes Estados, que impõem (sic) a Monarquia, restituindo os índios aos direitos, que lhes pertencem igualmente como aos meus outros vassalos livres…

Tratarei também de formar um Corpo efetivo de índios, bem como os Pedestres de Mato Grosso e de Goiases, …”

D. Maria I dá uma belíssima lição.

Ernesto Caruso

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