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Um país que tem Ministério Público atuante, como guardião da sociedade e da Constituição, na prática nem precisaria de Comissão Parlamentar de Inquérito, instrumento viril do poder Legislativo que deveria ser autônomo e respeitado, mas hoje é malsinado por muitos e vive o mesmo estado anêmico e aspecto adoentado daqueles que o adotam como prática investigativa. Infelizmente, o país não vê em nossos políticos capacidade de aprofundamento em porcas intenções acima dos próprios interesses. E as CPIs, chamadas por alguns de Coleção de Perguntas Idiotas, acabam dando em acordo-pizza ou em nada…Jamais vimos o “fato determinado” ser objeto de tanta chicana política como estamos presenciando. Instrumento da minoria, a CPI não pode decolar, porque a maioria governista não quer, jurando que são inocentes de antemão os que precisam ser investigados. “Que medo vocês tem de nós!” – dir-se-ía de volta para aqueles que antes gritavam e acusavam os governos ditatoriais…
A instalação da CPI da Petrobrás é o melhor exemplo do temor do estamento burocrático da empresa em ser investigado. Igual a ele só mesmo o do próprio poder Judiciário. que adiou por cinco anos a instalação de um controle externo. Na verdade, não desejava qualquer controle social, do mesmo modo que a empresa…
Os argumentos são sempre os mesmos: a Petrobrás já é auditada por controle interno e por instituições de credibilidade: uma auditoria estrangeira privada e, ainda, o famoso Tribunal de Contas da União, aquele ninho respeitável de políticos confiáveis que, cansados de disputar mandatos, vão para a “colenda” corte de contas gozar das delícias da vitaliciedade e inamovibilidade até a paradisíaca aposentadoria.
Diz o governo que quem deseje investigar a empresa o quer para privatizá-la, palavra mágica, como outras, genéricas, lançadas pela propaganda gramscista e goebeliana para torpedear qualquer iniciativa contrária aos interesses que exploram a empresa e são os atuais donos do poder.
Ora, todos sabem que a Petrobrás sofre de quase oito anos de intenso “aparelhamento” partidário, a princípio pelo PT e, mais recentemente, pelo PMDB. Os cargos-chave, até “aquela diretoria que fura poço” estão sob estrito controle político e os petroleiros só assistem à banda passar, com medo de perder os empreguinhos, ainda em estado de estabilidade, embora sejam celetistas…
O que o petroleiro entrega para manter-se estável é, no entanto, parte da alma e a quase totalidade de suas opiniões. Tive a oportunidade de comprovar isso, num seminário a que compareci, em 2008, em Manaus, por ironia com passagens e tudo pago pela empresa a uma ONG que me convidou, quando pude rever como se comporta o empregado da Petrobrás num seminário sobre meio ambiente e recursos da Amazônia.
Que decepção, ver os disciplinados petroleiros com dificuldade até de fazer uma pergunta, com medo de desagradar os chefes imediatos! Um pensamento cristalino que fosse deveria ser vestido com a cruel conformidade dos sabujos e bedéis! E política então, que é o que permeia até batizado do PT, nem se fala! É coisa de outro planeta! Os petroleiros, munidos com seus inteligentes laptops, alguns de barbicha, outros não, algumas engenheiras metidas e outras, mais simpáticas – enfim, aquele segmento de empresa paraestatal, exibiam a cultura típica do espírito de quartel, onde estão todos enquadrados e ninguém demonstrando qualquer lampejo de criatividade, a não ser até o grau permitido pelos chefetes! Isto é que é hierarquia e disciplina sem clarins!
Eis, para mim, sem complacência o quadro! Não há lá um burocrata que não repita as duas velhas frases conhecidas: “uma empresa de petróleo, mesmo mal administrada, é um grande negócio” e a indefectível, “quando eu me aposentar”, período futuro de sonho, quando o empregado, livre do fardo do servilismo mental, da subserviência e do cumprimento de horários rígidos e missões fragmentadas, se for previdente e econômico (e não há ser menos perdulário no mundo que um petroleiro!), irá gozar das delícias da aposentadoria, sentindo-se tal e qual um militar da reserva…
Seria preciso um Machado de Assis, um Lima Barreto ou um José Saramago para descrever a vida de um petroleiro! O que ele sofre para ser cego e não dizer o que pensa realmente, para não denunciar o que lhe passa por baixo das barbas e toca levemente as mãos, seria digno dos melhores romances ainda não escritos em língua portuguesa. No entanto, para tal obra ele jamais dará depoimento preciso, pelas razões expostas acima.
Como sofre essa gente que acha que carrega o país nas costas!
Pois bem, a CPI da Petrobrás nem começou e já provocou a baixa dos preços de alguns derivados nas refinarias, com automático aumento de impostos federais, e a institucionalização de um blog, como se a Petrobrás fosse pessoa física e devesse se defender instantaneamente pela Internet de ataques amadores…
Pobres jornalistas e profissionais de comunicação da casa, mais de mil!, que sofrem a concorrência de agências de publicidade, contratadas às vezes sem licitação para prover o imenso projeto de propaganda institucional que a empresa estruturou, a partir do início do governo petista!
Imaginem as agências contratadas (caixa 2), municiando dezenas de fornecedores indiretos, não auditados pela empresa-cliente porque escolhidos a dedo pelas agências, pagando gordas comissões e “bônus de volume”, aquela fortuna em dinheiro que não passa por qualquer controle e forma o melhor “caixa 3” do mundo?
O rastreamento desses bônus é muito difícil e já permitiu a formação de diversas empresas paralelas, dirigidas por parentes de ex-integrantes do “núcleo duro” do governo (2003-2006), cujo objetivo seria tão somente administrar as gigantescas boladas que se formavam na prática pela exploração publicitária da Petrobrás e de outras estatais. A dinheirama “quase não deixa rastros” e os indícios dessas práticas foram palidamente tocados pela CPI que investigou os Correios e que não chegou a qualquer conclusão relevante, muito pelo contrário!
Onde estão os “bônus de volume” sobre as campanhas e anúncios da Petrobrás? – eis aí um fato determinado que não será levantado a contento por ninguém, porque nem incluído foi no requerimento inicial da CPI…
O fantasma publicitário das estatais, capitaneado pela dupla azeitada PT-PMDB, seria um capítulo à parte, a ser explorado com coragem pelo Ministério Público e a Polícia Federal, já que não foi incluído nos temas candentes da CPI da Petrobrás, que ameaça nem sair.
Aliás, como bom carioca, ouso comparar a CPI da Petrobrás àquele bloco de carnaval “concentra, mas não sai” – em que os foliões mais satisfeitos (os senadores governistas), que têm o nome estampado nas garrafas de uísque doze anos e outras bebidas nobres, sorriem e brincam, satisfeitos, fazendo barulho inócuo, sem sair do lugar…
Waldo Luís Viana*
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* Waldo Luís Viana é escritor, economista, poeta e ex-petroleiro, que sempre deseja se livrar da empresa, mas ela teima em o perseguir…
Teresópolis, 12 de junho de 2009.