Entenda as mudanças na poupança anunciadas pelo governo

no images were found

Com o objetivo de conter o fluxo de capital especulativo para a caderneta de poupança e de acabar com um piso para o corte da taxa básica de juros (Selic), o governo anunciou nesta quarta-feira que cadernetas de poupança acima de R$ 50 mil passarão a pagar Imposto de Renda em 2010.

O tributo só será cobrado se a taxa básica de juros (Selic) cair abaixo de 10,5%. Atualmente, a taxa está em 10,25% ao ano, mas o imposto só valerá a partir de 2010.

Entenda o que muda a partir de 2010:

Quem será tributado?

As cadernetas de poupança com rendimento mensal superior a R$ 250, o que corresponde a um saldo de R$ 50 mil (0,5%).

tab_assalto_poupancaQuando a mudança entra em vigor?

As propostas do governo para a poupança ainda precisarão ser aprovadas no Congresso. As mudanças passam a vigorar para rendimentos a partir de janeiro de 2010.

Como será calculado o imposto a ser pago?

O governo estabeleceu o percentual de rendimento fixo de 0,5% ao mês da poupança para cobrar o Imposto de Renda. Sobre o montante, será deduzido o valor de R$ 250. Após isso, cobra-se um percentual que varia de 0% a 100%, dependendo do patamar da taxa Selic.

Exemplo: uma poupança com saldo de R$ 200 mil, em uma taxa Selic de 9% ao ano. O rendimento de 0,5% é igual a R$ 1 mil. Subtraídos os R$ 250, chega-se ao valor de R$ 750. Com a Selic a 9%, a parcela do rendimento tributada é de 30% (veja os valores na tabela), o que faz com que o imposto seja cobrado em cima de R$ 225. O Imposto de Renda varia de 27,5% a 15%.

E para aqueles que têm a poupança como a única fonte de rendimento?

Nesse caso, a tributação também dependerá da variação da Selic. Para a taxa de juros em 8,5% ao ano, por exemplo, só pagaria imposto quem tem saldo de R$ 986 mil na caderneta. Com a taxa Selic a 10%, o imposto seria cobrado das poupanças com saldo superior a R$ 1,923 milhão.

Como será feita a retenção do imposto de renda na fonte?

A retenção na fonte será feita com base na tabela do imposto de renda vigente no momento do crédito do rendimento. Considerando que o limite de isenção da tabela do IR para 2010 deverá ser de R$ 1.499,15 por mês, em caso de Selic em 10% ao ano, só teriam imposto recolhido na fonte as cadernetas com saldo superior a R$ 1,549 milhão. Com a Selic em 7%, o saldo mínimo seria de 349, 830 mil.

Como o contribuinte fará a declaração de renda?

No programa da declaração anual de ajuste, o contribuinte terá que incluir o valor do rendimento bruto da caderneta de poupança para cada um dos meses do ano anterior. O próprio programa fará os cálculos de dedução do rendimento isento e da redução da base de cálculo. Se o contribuinte tiver conta de poupança em mais de uma instituição financeira, ou se seus dependentes também tiverem conta de poupança, então para cada mês, deverá ser declarado o total dos rendimentos das diversas contas do titular e de seus dependentes.

Com informações de Cláudia Andrade

Da Redação da Folha de São Paulo

Em São Paulo

Poupança, o pior caminho prevaleceu

Pois bem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preocupado com os efeitos políticos na mudança do cálculo dos rendimentos da caderneta de poupança, optou, sim, pelo pior caminho. Em vez de enfrentar tecnicamente o problema, tomou medidas paliativas em seu governo, deixando a resolução final para o próximo presidente. Uma decisão que contrasta com aquele presidente do primeiro mandato, que não se cansava de repetir não ter receios de tomar medidas impopulares em nome da estabilidade econômica. Agora, curvou-se às pressões politiqueiras.

Pior ainda é que o caminho adotado vai acabar beneficiando, nesse ano, exatamente aquela turma que alguns petistas adoram atacar, mesmo muitos fazendo parte dessa galera: os rentistas. Isso mesmo, Lula vai baixar o Imposto de Renda de aplicações financeiras em fundos de investimentos caso o Banco Central faça nova redução na taxa de juros. Objetivo: torná-los mais atraentes que a caderneta de poupança.

Dentro do governo, auxiliares de Lula culpam a oposição de ter transformado o caso da poupança numa bandeira política. Com isso, teria ficado impossível seguir pelo caminho mais racional. Qual seja? Acabar com aquela parcela de juros tabelados para o rendimento da caderneta de poupança. Se um dia isso fez sentido, no cenário que se desenha para o Brasil perdeu totalmente a razão de existir. Com a taxa básica de juros do Banco Central caindo, caminhando para ficar abaixo dos dois dígitos, esse rendimento tabelado trabalha contra o bom funcionamento da economia.

Bem, explicando um pouco melhor o caso, hoje a poupança rende 6% de juros garantidos todo ano, mais a variação da TR (Taxa Referencial) –calculada com base na média dos juros cobrados por bancos na negociação de CDBs. Com os juros do BC caindo, os fundos de investimentos –aplicação preferida da classe média para cima– estão perdendo competitividade. Resultado: há o risco de uma migração de dinheiro dos fundos para a caderneta de poupança. E risco porque, nesse caso, o governo poderia ter dificuldades em rolar sua dívida, financiada pela grana dos rentistas aplicada nos fundos de investimento.

O governo deveria enfrentar de frente o caso e propor o fim dos juros tabelados de 6% anuais, deixando que cada banco ofereça a remuneração mais apropriada de acordo com as força do mercado. Não trilhou esse caminho. Acredita que isso não é tarefa para governo em fim de mandato. Mas o principal motivo, realmente, foi não dar munição para a oposição na véspera da eleição presidencial. Afinal, a oposição disse que o governo estava preparando um confisco ao estilo Fernando Collor –o que é uma grande mentira, mas na guerra política, infelizmente, tudo vale–, o suficiente para o governo Lula balançar e evitar mexer profundamente no sistema. E Lula realmente não quer alterar a vida da maioria dos poupadores brasileiros, principalmente os pequenos, que sempre viram na poupança um porto seguro para momentos de necessidade.

E, além de não ter trilhado o melhor caminho, não é que o governo acabou divulgando um conjunto de regras confusas, repleto de detalhes que requerem praticamente um manual para evitar erros. Enfim, pelo menos o governo fez algo para manter as taxas de juros em queda.

valdo_

Valdo Cruz, 48, é repórter especial da Folha. Foi diretor-executivo da Sucursal de Brasília durante os dois mandatos de FHC e no primeiro de Lula. Ocupou a secretaria de redação da sucursal. Escreve às terças.

E-mail: valdo@folhasp.com.br

Leia as colunas anteriores

[Voltar]